Notícias Balneário Camboriú Esportes Entretenimento Eventos Política Empregos Camboriú Itajaí Itapema Navegantes Santa Catarina Brasil e Mundo
NOTÍCIAS SANTA CATARINA

Encontro Luso-Brasileiro de Bioética encerra recomendando estímulo à integridade e aprimoramento moral na pesquisa

Encontro Luso-Brasileiro de Bioética encerra recomendando estímulo à integridade e aprimoramento moral na pesquisa

Os procedimentos experimentais, que atribuem ao ser humano a condição de participante de pesquisa, representam atualmente instrumento importante na busca por avanços médicos e científicos. Infelizmente, o processo histórico registra abusos evidentes no uso dessa ferramenta, os quais deixaram lições para as novas gerações.

O fim da Segunda Guerra Mundial revelou o trágico episódio que vitimou, por meio de experimentos brutais, milhares de judeus e de representantes de outras minorias étnicas. O julgamento desses crimes, pelo Tribunal Internacional de Nuremberg, em 1946, despertou a consciência dos povos com respeito à importância do estabelecimento de limites ao uso de seres humanos em estudos científicos, definindo regras para proteger seus direitos na busca do conhecimento.

Desde então, em diferentes normatizações e espaços de debates, a comunidade científica internacional espelha suas permanentes preocupações com respeito ao tema, num processo contínuo que tem protegido indivíduos e suas comunidades com base em princípios éticos e bioéticos.

Pouco mais de sete décadas, após os eventos de Nuremberg, o II Encontro Luso-Brasileiro de Bioética, realizado nos dias 14 e 15 de março de 2019, em Florianópolis (SC), configura plataforma oportuna para estimular avanços nessas reflexões, na perspectiva de contribuir para o aperfeiçoamento de práticas e de políticas públicas que se debruçam sobre o tema.

Sendo assim, os participantes do II Encontro Luso-Brasileiro de Bioética, cientes de sua responsabilidade com o fortalecimento de compromissos humanitários e humanísticos, éticos e bioéticos, para beneficiar mulheres e homens, de todas as idades e origens, na proteção de suas integridades respeitando suas peculiaridades socioculturais, defendem junto à comunidade científica e aos governos nacionais que sejam adotadas as 15 recomendações seguintes, distribuídas nos cinco eixos sob os quais foram estruturados os debates em Florianópolis.

1)   Evolução das normas nacionais e internacionais sobre ética em pesquisa

A dignidade humana e a ética no atuar e nas consequências do agir na seara da pesquisa científica envolvendo seres humanos deve ser preservada de comportamentos e procedimentos antiéticos e perniciosos à luz de normas existentes, as quais carecem de constante estudo, acompanhamento e controle por parte dos entes envolvidos. Trata-se de temática atual, pertinente e emergente no contexto dos Direitos Humanos, lastreada em princípios e valores éticos e bioéticos, com o intuito de proteger a vulnerabilidade dos participantes de pesquisa diante dos interesses das grandes corporações, da indústria e do sistema econômico, contemporizados e minimizados, e por indivíduos e instituições que desrespeitam a autonomia e a liberdade das pessoas, em especial nas áreas desfavorecidas. Com respeito a este tema, recomenda-se:

a)   O aperfeiçoamento do escopo normativo (legal e infralegal) destinado à defesa dos interesses dos participantes de pesquisa, sem flexibilizações ou ajustes que favoreçam agentes que privilegiam o lucro em detrimento da dignidade dos seres humanos;

b)   O fortalecimento de um sistema de controle e monitoramento de projetos de pesquisa com seres humanos, com o envolvimento ativo de instituições idôneas capazes de identificar, denunciar e responsabilizar eventuais abusos praticados;

c)   A conscientização e a sensibilização da comunidade científica e da população em geral a respeito de direitos e deveres no campo da pesquisa biomédica, num processo de educação contínuo e de formação cidadã.

2)      Pesquisa envolvendo seres humanos

No Brasil, com relação aos estudos genéticos, há dois tópicos que exigem atenção especial. O primeiro é a tramitação na Câmara Federal do Projeto de Lei n° 7.082/2017 (originado no PLS 200/2015), que dispõe sobre a pesquisa com seres humanos e institui o Sistema Nacional de Ética em Pesquisa Clínica com Seres Humanos. Ressalte-se que sua aprovação, conforme a versão atual, compromete a independência da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep) ao mudar sua composição em favor da participação governamental. O segundo é a assistência aos pacientes com doenças raras, tendo em vista dois aspectos: a  regulamentação do direito do participante de pesquisa ao acesso pós-estudo, em protocolos de pesquisa clínica destinados a pacientes com doenças ultrarraras, atualmente disciplinado pela Resolução CNS nº 563/2017, o que pode trazer impacto na melhora da qualidade de vida e aumento da sobrevida; e a implementação da Política Nacional para Atenção Integral às Pessoas com Doenças Raras (instituída pela Portaria nº 199/2014, do Ministério da Saúde), cujos objetivos são melhorar o acesso desse grupo aos serviços de saúde e à informação, reduzindo a incapacidade por estes transtornos e aumentando a qualidade de vida dos pacientes.  Diante desses desafios, recomenda-se:

d)   A atuação política de instituições junto ao Congresso Nacional, buscando a sensibilização dos parlamentares federais com respeito à necessidade de se proteger os direitos dos participantes de pesquisa, evitando-se assim mudanças na legislação que representem retrocesso nas normas éticas e bioéticas, como a inversão de valores que torna a parte frágil no campo da pesquisa o patrocinador, atribuindo-lhe ainda ações típicas da conduta médica;

e)   A preservação da independência e da autonomia do sistema formado pela Conep e pelos mais de 800 Comitês de Ética em Pesquisa (CEPs) distribuídos nas diferentes instituições, com base nas resoluções nº 466/2012 e nº 510/2016, ambas do Conselho Nacional de Saúde (CNS), assegurando-lhe condições de cumprir sua função principal, que é a proteção dos participantes das pesquisas em seus direitos e legislação que normatiza a ética em pesquisa envolvendo seres humanos e mantendo-o como um estrutura de Estado, e não de Governo;

f)    A garantia de apoio à implementação integral e ao aperfeiçoamento das políticas públicas de saúde voltadas à atenção integral às pessoas com doenças raras, ampliando o acesso e qualificando o atendimento aos pacientes com essas características, inclusive com a manutenção do tratamento efetivo pós-pesquisa àqueles que tiverem participado de estudos científicos.

3)   Pesquisa biomédica em animais

A utilização de animais não humanos em pesquisas científicas e no ensino, ainda que recorrente, é motivo de controvérsia em função de limitações morais. Uma delas, a exploração dos animais pelo ser humano por meio de sua instrumentalização, explicita, no âmbito das investigações éticas e bioéticas, o tratamento a ser dado aos seres envolvidos nesses estudos. Tal questão envolve debates que vão do status moral dos animais até a demarcação de sua proteção pela identidade de seres sencientes (capazes de sentir, capazes de sofrer). No Brasil, a Lei nº 11.794/2008 (Lei “Arouca”) regulamentou o uso de animais em pesquisas científicas e no ensino, sendo considerado marco no aprimoramento de sua utilização humanitária, monitorando e avaliando a introdução de técnicas alternativas que substituam sua adoção, reduzindo-o e refinando protocolos experimentais que minimizem dor e estresse, sempre que possível.  Além disso, estabeleceu e legitimou o sistema nacional de avaliação ética do uso animal, determinando a criação do Conselho Nacional de Controle de Experimentação Animal (Concea). Neste sentido, recomenda-se:

g)   A consolidação das Comissões de Ética no Uso Animal (Ceua) em pesquisas biomédicas, como forma de fortalecer o sistema de proteção aos seres não humanos no desenvolvimento de estudos biomédicos, evitando sua exposição a situações degradante, à dor e ao estresse, entre outros abusos;

h)   A promoção de ações educativas e de produção de conhecimento junto a grupos e instituições de pesquisa e à população em geral que contribuam para a difusão dos princípios relacionados à ética da proteção animal, contribuindo para que o uso de seres não humanos em estudos biomédicos seja reduzido e, se necessário, conduzido num contexto de respeito e dignidade para com a vida.

4)   Desafio das pesquisas sobre aprimoramento humano e moral

O desejo de melhorar é inerente ao ser humano, que busca atendê-lo por meio de métodos conhecidos como “tradicionais”, representados pela educação e a socialização, antigos como a própria humanidade. Esse contexto tem despertado um impulso em buscar o aprimoramento moral através das neurociências e da antropotecnia, com intervenções que se dispersam pela literatura científica, incorporando o uso de vários tipos de psicofármacos, experimentos de estímulos cerebrais profundos, engenharia e seleção genética, etc. É possível melhorar o ser humano do ponto de vista físico e moral? Os procedimentos que visam a recuperação do paciente também podem ser úteis para melhorar o desempenho físico e moral de pessoas sadias. Contudo, esta utilização envolve implicações éticas relevantes, já que se afasta parcialmente do tradicional sentido da medicina hipocrática de tratar pessoas doentes para proporcionar-lhes a cura. Nesse sentido, recomenda-se:

i)        A cautela dos médicos e pesquisadores no emprego de recursos já disponíveis para promover o aprimoramento físico e moral dos indivíduos, em atenção aos limites previstos nas normas de pesquisa com seres humanos e de conduta profissional em medicina;

j)        A adoção de maior critério no uso de neurotecnologias, como a estimulação transcraniana, no tratamento de algumas patologias ou na condução de estudos clínicos sob o argumento de proporcionar o melhoramento da conduta e do bem-estar humano, tendo em vista o risco real de privação da autonomia e da liberdade das pessoas;

k)   O reforço à proibição de técnicas com o uso da engenharia genética visando o melhoramento humano, como já é previsto no campo da ética que interdita, terminantemente, mudanças na linha germinal humana, uma vez que são permanentes, lembrando ainda que tal procedimento pode comprometer os direitos das pessoas vindouras;

l)        A realização de mais estudos e debates sobre o tema do aprimoramento humano e moral, que, embora revista-se de aspectos desejáveis, ainda carece de reflexões sobre seus efeitos, riscos e aspectos éticos de sua utilização.

5)   Influência da indústria de fármacos na pesquisa biomédica

Em maio de 2005, o Conselho Federal de Medicina (CFM) divulgou sua Resolução nº 1.595, que proíbe a vinculação da prescrição médica ao recebimento de vantagens materiais oferecidas por agentes econômicos interessados na produção ou comercialização de produtos farmacêuticos ou equipamentos de uso na área médica. O texto ainda determina que os médicos, ao proferirem palestras ou escreverem artigos sobre produtos farmacêuticos ou equipamentos para uso na medicina, declarem os agentes financeiros que patrocinam suas pesquisas e/ou apresentações. Cabe-lhes também indicar a metodologia empregada em seus estudos – quando for o caso – ou referir a literatura e bibliografia de base utilizadas na apresentação, quando essa tiver por natureza a transmissão de conhecimento proveniente de fontes alheias. Com respeito a essa temática, recomenda-se:

m)   Assegurar as garantias à proteção do participante de pesquisa, principalmente as relativas ao uso de placebo, quando houver tratamento alternativo, assim como a continuidade do tratamento após o encerramento do estudo e a preservação do sigilo, da privacidade e da confidencialidade;

n)   O aperfeiçoamento de normas que eliminem situações de conflito de interesse na condução e divulgação de pesquisas biomédicas, assegurando autonomia, isenção e idoneidade no campo científico.

Finalmente, os participantes e instituições representadas no II Encontro Luso-brasileiro de Bioética se colocam à disposição para contribuir com a implementação dessas 15 recomendações e reiteram seus compromissos com o ser humano e com a ciência, entendendo que o avanço do conhecimento, bem como o acesso aos seus benefícios, deve ter como objetivo maior a preservação da vida e da saúde dos indivíduos e de suas comunidades.

Posts Relacionados

Boletim mostra que falta de chuva impacta no abastecimento de água em 167 municípios catarinenses

Projetos da Alesc sobre a Covid-19 são transformados em leis

Diário da Cidade

Coronavírus em SC: Alunos da rede estadual recebem materiais impressos para atividades não presenciais

Coronavírus em SC: Governo do Estado recebe lote com mais 34 mil testes rápidos e EPIs

Coronavírus em SC: Portarias estabelecem normas para funcionamento de shoppings, academias e serviços de alimentação

Simple Organic doa de itens de skincare para ajudar profissionais da saúde em Florianópolis

Motoristas podem pedir certidão de registro da CNH no Detran Digital

Santa Catarina torna obrigatório o uso de máscaras e álcool gel em estabelecimentos

Diário da Cidade

Escola em Florianópolis disponibiliza gratuitamente vídeos para estudos

Sebrae de Brusque retorna com atendimento presencial nesta quarta-feira