Blumenau era uma terra fértil, um convite à entrada do Grupo Odebrecht. Com apenas 4,8% de esgoto tratado em 2010 e a necessidade, por lei, de ampliar a coleta, a terceira maior cidade de Santa Catarina ingressava na lista de interesses da empresa. Somam-se esses fatores a um contrato de longa duração, com valores milionários e potencial para angariar aditivos financeiros e entende-se o porquê de a cidade estar no olho do furacão da Operação Lava-Jato, já que não havia, à época, outra empresa capaz de prestar o serviço na cidade que não fosse a Foz do Brasil. É fácil explicar: mais antiga concessionária da rede de esgoto em uma cidade brasileira – Limeira (SP), em 1995 – e último conglomerado até então a ter chegado a uma cidade com população superior a 300 mil habitantes – Mauá (SP), em 2000 –, a empresa já tinha contatos e conhecimento suficientes para se consolidar em Blumenau e garantir mais uma frente de trabalho entre as que detinha em todo o país.
Veja a linha do tempo sobre a presença da Odebrecht em Blumenau
E é justamente em 2010 que a empresa desembarca em Blumenau. O Consórcio Saneblu – formado pelas empresas Foz do Brasil S/A, Odebrecht Engenharia S/A e Engeform – vence a licitação pelo esgoto de Blumenau. A partir daí, conforme delação do ex-diretor Paulo Roberto Welzel, a empresa percebe a necessidade de comprar apoio político, para não passar dificuldade financeira. Foi aí que chegou a políticos-chave. Conforme dois inquéritos apresentados na terça-feira pelo Supremo Tribunal Federal (STF), nesse momento ocorreu o start para articulações em busca de facilitação em benefício do Grupo Odebrecht na cidade. Segundo o inquérito, a empresa procurava contatos que pudessem apoiar a “manutenção dos contratos de saneamento de água e esgoto”. Ou seja, facilitar a continuidade dos trabalhos na cidade. Foi assim que a Odebrecht identificou candidatos a prefeito em Blumenau e, conforme Welzel, teria mandado dinheiro para três dos quatro pretendentes à cadeira mais importante do Executivo em Blumenau em 2012 por meio de caixa 2.
A ideia era simples: atirar para todos os lados entre os que tinham chance de ganhar – apenas o candidato Osni Wagner (Psol) ficou de fora – e garantir, com isso, benefícios em favor da concessão. À época, já atuava há dois anos na cidade. Na prática, segundo delação do ex-diretor Paulo Roberto Welzel, a Odebrecht queria garantir que o próximo prefeito ou prefeita de Blumenau facilitasse as negociações referentes a um pedido de reequilíbrio financeiro feito pela empresa no fim de 2010 – mas que até então não havia sido atendido. Em uma lógica corrupta: para que não tivesse um prejuízo de R$ 118 milhões, a Odebrecht teria pago R$ 500 mil para cada um dos três candidatos – Ana Paula Lima (PT), chamada de “Musa”, Jean Kuhlmann (PSD), que tinha o codinome “Alemão”, e Napoleão Bernardes (PSDB), apelidado de “Conquistador”. Na prática o grupo teria investido R$ 1,5 milhão do seu departamento de propinas para não tomar uma ré maior à frente.
Então a eleição termina, Napoleão Bernardes se torna vencedor e, logo no início do mandato, conforme delação do ex-diretor Paulo Roberto Welzel, recomeçam as tratativas entre prefeitura e Odebrecht para evitar que a empresa tivesse prejuízos.
Escândalo se configura como o maior da história na cidade
Esse novo escândalo exposto em depoimentos que agora começa ser investigado, envolve diretamente cinco políticos blumenauenses e é, de longe, a maior repercussão política negativa da cidade em toda sua história. Acostumada a ter sua imagem atrelada a boas notícias em rede nacional – seja por turismo, festas, belezas naturais ou iniciativas exemplares –, Blumenau vivencia agora o peso de estar no mesmo rol de suspeitos, de ações duvidosas, de supostos favorecimentos. E mais do que isso: a cidade amarga ver a política local, ainda que em âmbito de suspeição, relacionada com delações da Odebrecht, empresa pivô do maior esquema de corrupção da história do Brasil e que tem o seu executivo, Marcelo Odebrecht, preso.
A Operação Tapete Negro, aquela investigação que apurou irregularidades na terceirização de obras da URB, trazida à tona há quatro anos e quatro meses, espantou os blumenauenses por uma proximidade com o dia a dia. Lamentavelmente, a colocação do município no mapa da Lava-Jato elevou a um patamar mais negativo ainda a desconfiança da população sobre a política local. Traz uma grande interrogação quanto aos próximos passos que serão dados, tanto no Legislativo, quanto no Executivo da cidade.